Reflexão

O banho da perereca



Pr. Egon Lohmann

Tempos atrás li à respeito de uma experiência com rãs. Jogada na água aquecida, a rã imediatamente saltava fora, ilesa . Contudo, quando deixada na água fria, mas aquecida aos poucos, não se dava conta do gradual aumento da temperatura e acabava morrendo. Lia Luft em sua coluna na Revista Veja, comenta como sua avó, “luterana fervorosa”, ficava indignada com alguns fatos que para ela significavam “o fim do mundo”. Segue citando a inversão de valores e outros absurdos de nossos dias e aos quais, aos poucos, vamos nos acostumando e aceitando como normais.
Enquanto isso, o fim do mundo ainda não chegou. Próximo, talvez, esteja o fim de um mínimo de ética e vergonha da parte de políticos e governantes; o fim da tranqüilidade na cidade, onde ser assaltado já faz parte da normalidade; o fim do respeito e da consideração para com o idoso, os pais, professores e líderes espirituais; o fim de uma educação que, ao mesmo tempo, ama e disciplina a criança, ensinando-lhe até onde vão seus limites e onde começam os limites do outro; o fim de uma cultura de trabalho que faz bem feito, faz com amor, com honestidade e responsabilidade; o fim da reverência a Deus e da gratidão pelas boas coisas que criou! Onde a indignação, onde o protesto de pessoas como o daquela avó? Estamos no “banho de perereca”, impassíveis para com as incongruências à nossa volta? E, quando ainda ficamos indignados, o que nos resta? Você sente como eu sinto às vezes, o tamanho da onda e a incapacidade de enfrentá-la? Ficamos perdidos, talvez anestesiados, no meio de tantas urgências, tanto caos, tanto descalabro!
Contudo, a palavra de Deus põe ordem no caos e cria as condições para a vida (Gn 1). É esta mesma palavra que nos recomenda: “Transformem-se, pela renovação da sua mente...para que experimentem a boa vontade de Deus”(Rm 12,2). Que tal, levar isto a sério e começar a pensar diferente? E, ao invés de sair correndo sem rumo e sem prumo, sem orientação do alto, seguir a recomendação de Jesus, de orar – antes de agir? (Mateus 9,37-38). A recomendação é feita no contexto da evangelização, mas se aplica igualmente, à atuação profética de denunciar e cobrar mudanças. Não por acaso, já o profeta Jeremias e o salmista recomendam que oremos pela paz e busquemos o bem-estar da cidade (Jr. 29,7 e Sl 122,6). Quem sabe, se o fizermos, o Senhor mostrará também a nós, o que fazer e por onde começar?! Quem sabe a indiferença dê lugar a uma justa indignação e aflore também, com ela, a capacidade de agir no lugar e a partir do lugar onde Deus nos colocou!

Extraído do Jornal Sinodal - TEXTO E CONTEXTO

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